O Montado de Sobro

História e enquadramento geral

A Quinta Grande é um vasto mosaico
agro-silvo-pastoril onde o montado de sobro estrutura a paisagem, a economia e
a biodiversidade.
Com uma área total de 1 521,46 hectares, a propriedade integra uma Zona de Intervenção
Florestal do Baixo Sorraia (ZIF n.º 137), gerida pela APFC – Associação de
Produtores Florestais de Coruche, que assegura o enquadramento técnico, a
gestão partilhada e a coordenação regional da prevenção de incêndios rurais.
O levantamento com base em Sistemas de Informação Geográfica do plano florestal
identifica 954,42 hectares de superfície florestal arborizada e 31,69 hectares
de área florestal desarborizada,
sendo o restante composto por zonas agrícolas, charcas, galerias ripícolas e
áreas de uso misto, que completam o mosaico ecológico e produtivo da Quinta
Grande.
Estrutura e tipologia do montado
A floresta de sobro da Quinta Grande apresenta três estádios de desenvolvimento, que se complementam e garantem a regeneração contínua e a sustentabilidade do sistema.
Dentro dessa mancha, o montado de sobro é o
principal ecossistema arbóreo e o elemento estruturante da gestão florestal.
Distribui-se por cerca de 900 hectares, dos quais 600 hectares correspondem a
montado puro, onde o sobreiro (Quercus suber) domina quase em
exclusividade, e 300 hectares integram um montado misto com pinheiro-manso (Pinus
pinea).
Juntos, formam uma das maiores e mais consistentes manchas privadas de montado
do Ribatejo.
Ao
longo de décadas, este sistema foi gerido com uma visão de longo prazo —
conciliando produção de cortiça, pecuária, conservação da natureza e da
biodiversidade e valorização ambiental.
O modelo adotado pela Quinta Grande é hoje exemplo de equilíbrio entre tradição
e inovação, demonstrando como o sobreiro continua a ser uma árvore de futuro,
capaz de sustentar simultaneamente a economia, o clima e a biodiversidade.


Regeneração natural
Áreas onde jovens sobreiros nascidos de semente
natural são identificados, georreferenciados e protegidos com tubos e cercas
móveis.
Representam a continuidade genética do montado e um dos seus maiores valores
ecológicos.
Em 2021 foram instaladas 4 354 proteções individuais em regenerações
espontâneas, reforçando a capacidade de renovação do sistema sem necessidade de
plantações extensivas.
Estas zonas são temporariamente excluídas do pastoreio da vacada Mertolenga até
as árvores atingirem altura e robustez suficientes, garantindo a sua
sobrevivência e crescimento.
Montado adulto
Formado por árvores maduras/adultas e
produtivas, com copas desenvolvidas e tiragens regulares de cortiça.
Este é o coração produtivo da propriedade, garantindo sombra, alimento,
estabilidade ecológica e uma cortiça de elevada qualidade.
O inventário florestal de 2021 registava um Perímetro à Altura do Peito (PAP)
médio de 1,46 m e uma intensidade de exploração muito prudente — 87% dos
sobreiros classificados entre "muito pouco" e "pouco explorados" — assegurando
o vigor e o calibre futuro da cortiça.
As campanhas de tiragem seguem o ciclo novenal, com planeamento faseado e
marcação anual, respeitando as condições fisiológicase climáticas.
O pastoreio sob copa é cuidadosamente gerido, permitindo controlar o mato e favorecendo a regeneração natural, mantendo assim um equilíbrio entre coberto arbóreo e herbáceo.
Plantação manual e adensamentos
Implantada em clareiras, margens e novas parcelas,
utiliza plantas micorrizadas de proveniência regional, assegurando adaptação
genética e fisiológica ao solo e ao clima local.
Estas plantações reforçam a densidade do coberto e aceleram a transição entre
gerações de árvores, mantendo a continuidade produtiva e ecológica do montado.
O compasso e o espaçamento são definidos para permitir boa insolação,
crescimento equilibrado e integração com pastagens naturais.

Valor ecológico e serviços ambientais
O montado da Quinta
Grande é um ecossistema mediterrânico de alta resiliência.
A interação entre sobreiros, pastagens e matos autóctones cria um ambiente de
grande riqueza biológica e um aliado essencial no combate às alterações
climáticas.
- Funções principais:Protege o solo contra erosão e compactação, retendo água e promovendo infiltração.
- Regula o microclima e reduz o risco de incêndio, graças ao sombreamento e ao
pastoreio controlado.
Atua como sumidouro natural de carbono, contribuindo para a neutralidade climática certificada da Quinta.
Mantém um mosaico de habitats para aves, mamíferos, répteis, anfíbios e insetos.
Alimenta polinizadores e aves insetívoras, que controlam naturalmente as populações de pragas.
Reforça a conectividade ecológica entre áreas húmidas, turfeiras, pinhais e galerias ripícolas. - Regula o microclima e reduz o risco de incêndio, graças ao sombreamento e ao pastoreio controlado.
- Atua como sumidouro natural de carbono, contribuindo para a neutralidade climática certificada da Quinta.
- Mantém um mosaico de habitats para aves, mamíferos, répteis, anfíbios e insetos.
- Alimenta polinizadores e aves insetívoras, que controlam naturalmente as populações de pragas.
- Reforça a conectividade ecológica entre áreas húmidas, turfeiras, pinhais e galerias ripícolas.
A gestão florestal prioriza as espécies autóctones, conservando a integridade ecológica e os equilíbrios naturais do ecossistema mediterrânico.
Vacada Mertolenga,
equilíbrio e gestão
A vacada Mertolenga,
com cerca de 75 vacas aleitantes e dois sementais, é parte integrante do
montado.
A sementeira de prados temporários e o pastoreio rotacional e adaptativo
contribui para o controlo da vegetação, a reciclagem de nutrientes e a redução
de combustível fino, mantendo o equilíbrio entre produção e conservação.
A raça Mertolenga, adaptada ao clima de sequeiro e ao mosaico de pastagens, é
essencial para compatibilizar economia e ecologia.

Durante a primavera e o período de queda de bolota no inverno, o gado utiliza o sob-coberto como área forrageira, beneficiando de um alimento natural e ajudando à dispersão de sementes.
Nas áreas de regeneração, o acesso é temporariamente restrito, garantindo o desenvolvimento seguro das jovens árvores e a estabilidade do solo.
A carga animal é ajustada conforme a biomassa herbácea e os indicadores do inventário.
Flora e fauna associada

O
montado de sobro da Quinta Grande é um ecossistema vivo e equilibrado, onde a
diversidade natural é o motor da sua sustentabilidade.
A flora mediterrânica forma um tapete de pastagens de gramíneas e leguminosas
espontâneas, enriquecido por matos aromáticos e melíferos — como as estevas, o
rosmaninho, o lentisco, o folhado, o medronheiro e as urzes — que alimentam
polinizadores e protegem o solo durante todo o ano.
Entre copas e clareiras, encontram-se espécies autóctones como o zambujeiro, a
murta e o folhado, que reforçam a estrutura do habitat e criam abrigo para
inúmeras formas de vida.
Flora - um património vivo de resiliência e beleza
A flora do montado é
uma verdadeira tapeçaria de espécies autóctones, adaptadas à secura estival e
ao frio do inverno.
Sob as copas dos sobreiros, formam-se pastagens mediterrânicas onde dominam gramíneas
anuais (Bromus, Aira, Vulpia, Agrostis, Cynosurus) e leguminosas espontâneas
(Trifolium, Ornithopus, Medicago, Lupinus, Lotus), que enriquecem o solo em
azoto e alimentam o gado.
Nos espaços abertos e
orlas de copa crescem matas baixas e matos estruturantes, compostos por estevas
(Cistus ladanifer, Cistus salvifolius), rosmaninho (Lavandula stoechas, L.
viridis), urze-branca (Erica arborea), sargaço (Halimium halimifolium),
medronheiro (Arbutus unedo), folhado (Phillyrea angustifolia), lentisco
(Pistacia lentiscus) e murta (Myrtus communis).
Estas espécies aromáticas e melíferas alimentam abelhas, borboletas e abelhões,
sustentando a apicultura local e o equilíbrio polinizador da paisagem.
Nos vales e linhas de água, a flora torna-se mais exuberante, com tamargueiras (Tamarix africana), salgueiros (Salix atrocinerea), freixos (Fraxinus angustifolia) e comunidades herbáceas húmidas que integram espécies raras de junças (Juncus spp.) e sanguinhos (Frangula alnus), características das pequenas turfeiras e áreas de conservação.
Entre os matos e
charnecas, surgem plantas discretas mas valiosas — asfódelos (Asphodelus
ramosus), perpétuas-das-areias (Helichrysum stoechas) e serpol (Thymus
mastichina) — que perfumam o ar e anunciam a primavera.
Nas encostas mais abertas, o zambujeiro (Olea europaea var. sylvestris) e o lodão-bastardo
(Celtis australis) marcam transições para habitats agrícolas, formando
corredores ecológicos essenciais.
Toda esta flora contribui para a fertilidade do solo, protege-o contra erosão e cria micro-habitats que permitem o desenvolvimento de líquenes, musgos e fungos — indicadores de pureza atmosférica e saúde ecológica. A madeira morta, mantida propositadamente no terreno, serve de abrigo a microrganismos decompositores e fungos saproxílicos, responsáveis pela renovação natural do solo.
Fauna - o montado como refúgio e abrigo
O montado é também o epicentro
da vida selvagem da Quinta Grande.
A avifauna é particularmente expressiva, com espécies residentes, migratórias e
invernantes que dependem das copas, cavidades e recursos alimentares do sobro.
Entre as aves mais
observadas destacam-se o peneireiro-vulgar (Falco tinnunculus), a águia-calçada
(Hieraaetus pennatus) e o milhafre-preto (Milvus migrans), patrulhando o ar
acima das copas.
Nas árvores nidificam o pica-pau-verde (Picus viridis), o gaio (Garrulus
glandarius), a poupa (Upupa epops) e os chapins (Cyanistes caeruleus, Parus
major), que se alimentam de insetos xilófagos.
Nas zonas abertas, o trigueirão (Emberiza calandra), o cartaxo (Saxicola
rubicola) e a cotovia-arbórea (Lullula arborea) animam o pasto, enquanto o cuco
(Cuculus canorus), mocho-galego (Athene noctua) e bufo-real (Bubo bubo)
simbolizam o silêncio e o mistério noturno do montado.
Os mamíferos são
igualmente diversos: raposa (Vulpes vulpes), texugo (Meles meles), doninha
(Mustela nivalis) e gineta (Genetta genetta) percorrem o subcoberto à procura
de alimento.
O javali (Sus scrofa), espécie cinegética e ecológica, contribui
involuntariamente para a mobilização do solo e a germinação de bolotas.
Nas margens das charcas, coexistem rãs-verdes (Pelophylax perezi) e tritões
(Triturus marmoratus), enquanto lagartos-ocelados (Timon lepidus) e sardões
(Psammodromus algirus) dominam as zonas mais secas e ensolaradas.
Os
morcegos insetívoros, como o morcego-de-ferradura-pequeno (Rhinolophus
hipposideros), utilizam cavidades naturais e cortiça rugosa como abrigos
diurnos, desempenhando um papel crucial no controlo natural de insetos
noturnos.
E entre as camadas de madeira morta, vive uma infinidade de invertebrados
saproxílicos — escaravelhos, borboletas-de-noite, formigas e abelhas-solitárias
— que sustentam a teia alimentar do montado e mantêm o equilíbrio ecológico.